Para onde vai a coluna social?

Para onde vai a coluna social?

Por: Jorge Carvalho do Nascimento – Jornalista, professor, doutor em Educação, membro da Academia Sergipana de Letras e presidente da Academia Sergipana de Educação

 

A chegada da primeira dama do colunismo social sergipano ao Jornal da Cidade não turbou a importância de outros colunistas sociais que ali atuavam. João de Barros, até então o nome mais importante do gênero no periódico, celebrou a chegada de Thais Bezerra. “Começamos hoje um tempo novo em nosso Jornal da Cidade. Este Segundo Caderno que era do domingo, passa a circular no sábado, com tudo a que temos direito e com todos os companheiros. Amanhã será a vez da nossa companheira Thais Bezerra.

A chegada de Thais Bezerra amanhã pelo Jornal da Cidade, está sendo esperada com muita expectativa, principalmente pelo seu modo descontraído e inteligente de saber promover o rebuliço social em nossa amada terrinha”.

João de Barros e Lurdinha Gusmão assinavam as duas colunas sociais que o jornal publicava diariamente e mantiveram seus espaços. João de Barros, o Barrinhos, era um jornalista muito influente que antes de trabalhar no Jornal da Cidade havia passado pelos jornais Diário de Aracaju e Gazeta de Sergipe. Além de atuar na mídia impressa, fazia também coluna social na TV Atalaia. Lurdinha Gusmão era colunista do Jornal da Cidade e também mantinha uma coluna social na Rádio Cultura de Sergipe.

Amaral Cavalcante assinava a coluna PIQUE GERAL. Alternativo, irônico e debochado, Amaral imprimia à sua coluna o seu próprio estilo. Além de registros tradicionais das figuras do high society, a coluna noticiava polemicamente questões da política e da cultura na provocativa seção VOCÊ VIU. O poeta aproveitou um conhecido ditado popular sergipano e ao lado do título da coluna, uma gata (o animal de quatro patas, mesmo) fotografada de trás para frente com a cauda levantada e o ânus à mostra.

O figurinista Adilson Silva assinava a coluna JORNAL DA MODA.

O movimento que se observava naquele período era o de um processo de personalização da informação característico das sociedades de informação massificada. As grifes jornalísticas ganharam muita importância num processo no qual os leitores perderam a capacidade de digerir a “tsunami” noticiosa à qual todos estão expostos.

Veículos de comunicação como o Correio de Aracaju, a Gazeta de Sergipe, o Diário de Aracaju, o Jornal da Cidade e o Cinform foram impressos locais que valorizaram muito esse tipo de jornalismo. E isto incluía um tipo de profissional que ganhou importância desde a metade do século XX: o repórter fotográfico.

Nas festas daqueles que desejavam se expor nas colunas sociais, os fotógrafos eram personalidades tão importantes quanto um bom menu. Muitos deles eram bem articulados com colunistas sociais e contratá-los para dar cobertura a uma festa era quase implicitamente contratar um espaço em determinada coluna.

Em Sergipe, foram importantes nomes como os de Humberto Mendonça, Walmir Mendonça, Lineu Lins de Carvalho, Luiz Carlos Lopes Moreira, Osmar Matos, Marcel Nauer, Acrísio Siqueira, Charles, Marcos Lopes e Flávio Monteiro. Cobravam caro, mas quase sempre o que eles fotografavam virava notícia em coluna social.

A própria Thais Bezerra revelou frequentar poucas festas, afirmando que sempre teve boas fontes de informação nos fotógrafos. “Eles sempre me mandam matérias que eu quero divulgar, imagens dos eventos e registros detalhados das coisas que aconteceram, nos casamentos, nos aniversários, nas inaugurações, nas recepções”.

Normalmente, as pessoas que frequentavam aquele tipo de festa não viam tal procedimento como problema. No artigo “Convide e Apareça”, publicado pelo Observatório da Imprensa em 1998, Marcelo Camacho ensina que a importante promoter do Rio de Janeiro, Ana Maria Tornaghi, considerava que “na vida social, tudo é ligado a uma troca de interesses”.

De acordo com Mário Erbolato, em seu livro JORNALISMO ESPECIALIZADO, publicado no ano de 1981, naquele mundo, o colunista social era uma espécie de “semideus por todos elogiado – ainda que hipocritamente – porque dele dependia projetar os seus amigos e conhecidos, ou condenar ao ostracismo jornalístico até a mais importante das personalidades” (p. 38).

Colunistas como Jacinto de Thormes e Ibrahim Sued foram grandes nomes do velho estilo do colunismo social que ganharam reconhecimento em todo o Brasil. Com Ibrahim Sued, certamente, fechou-se o ciclo dos colunistas sociais que tinham acesso aos espaços mais fechados e desfrutavam de muito prestígio junto aos grupos da elite.

Ele foi o mais notório de todos eles, inclusive por seu estilo particularíssimo de se expressar, com bordões que ficaram famosos. Ele não parecia incomodar-se com o epíteto de iletrado, com que era frequentemente brindado. A propósito desse propalado deslustre cultural, conta-se que certa vez em uma reunião na sede de uma famosa revista carioca em que o proprietário admoestava fotógrafos e repórteres contra os males da ignorância, sustentando que o estudo era a única forma de subir na vida, achava-se presente Ibrahim, que na época fazia algumas entrevistas para aquela revista.

De acordo com Muniz Sodré, no artigo “Colunismo Social: Gente Boa e Gente Fina”, publicado em 2004 pelo Observatório da Imprensa, com o tom desabusado que o caracterizava, Sued interrompeu a fala do outro: “Isto não é verdade! Você e eu somos a prova viva de que, neste país, estudo é desnecessário”. O prestígio de Ibrahim Sued lhe permitia chistes desta natureza.

No livro 20 ANOS DE CAVIAR, o colunista social Ibrahim Sued revelou ter sofrido forte influência de colunistas como Walter Wintchell e Elza Maxwell, além de haver introduzido algumas inovações no colunismo social brasileiro: “Criei novas palavras e expressões, que se incorporaram ao vocabulário popular – os neologismos so the say, very kar, bomba, shangai, deslumbrada, boneca, caixa alta, caixa baixa, hidráulico, dragar, pantera, champanhota, 10 mais, cocadinha, cintilante, bola branca, bola preta, ademã, de leve, além de frases que ficaram famosas como: linda de morrer, que foi slogan para campanhas publicitárias, os cães ladram e a caravana passa, em sociedade tudo se sabe, depois eu conto, sorry periferia, geração pão com cocada, rebu (para rebuscado), NI (notória importância, VIP já era)” (SUED, 1972).

O colunismo social foi mesmo marcante na mídia brasileira durante a segunda metade do século de XX. No caso de Sergipe, como já vimos, o cenário foi marcado por grandes nomes já vistos por esta série de textos, como Thais Bezerra, Lânia Duarte, Clara Angélica Porto, Leilinha Leite (pseudônimo do jornalista Ivan Valença), Maria Luiza Cruz, Paulo Nou e Luiz Adelmo Soares de Souza.

Alguns nomes de colunistas sociais merecem ser olhados de modo especial. Karmen Mesquita, Luduvice José, João de Barros, Fernando Sávio, Lurdinha Gusmão, Luiz Eduardo Oliva, Roberto Lessa, Pedrito Barreto, Sacuntala Guimarães, Yara Belchior, Cristina Souza, Márcio Lyncon, Alberto Falk e alguns outros. Como Bonequinha, nas décadas de 50 e 60, nos anos 70 e 80 a jornalista Karmen Mesquita manteve coluna social nas emissoras de rádio Atalaia e Aperipê. Bonequinha, que já foi comentado por este trabalho que destacou o seu estilo Dandi, deixou muitos registros na memória dos sergipanos.

Intelectual refinado, o jornalista Carlos Henrique de Carvalho, o Bonequinha, era um advogado de sucesso e depois ingressou na carreira do Ministério Público estadual como Promotor. Bem posicionado nas famílias tradicionais de Sergipe, era casado com a irmã do vice-governador da gestão de Paulo Barreto de Menezes, Adalberto Moura.

Franzino, sempre muito bem vestido, eloquente, arrogante e elitista, manifestava explicitamente o seu preconceito em relação a pessoas e grupos sociais que considerava inferiores. Era poeta , considerado bom poeta. Diante dele, as pessoas tinham a impressão de estar vendo uma figura saída das cortes europeias renascentistas.

Pessoas que conviveram com ele afirmam que se comprazia com a entourage dos poderosos e, mesmo neste grupo era intolerante com aqueles que não lhe caíam bem. Algumas pessoas relatam que durante o governo Leandro Maciel, Bonequinha evitava sempre a companhia do também Promotor João Marques Guimarães, um volumoso, glutão e erudito jornalista apelidado preconceituosamente de “Pulga Prenha”.

Testemunha que à época era criança relata ter avistado “Pulga Prenha” acompanhando o governador Leandro Maciel durante um almoço na casa do seu avô, no interior do Estado de Sergipe, na cidade de Boquim. O relato diz que Marques Guimarães impressionava tanto pela erudição do discurso quanto pelo intensivo uso do garfo.

Promovido pelo líder político Benjamin Fernandes Fontes, tio da menina que testemunhou o evento, o banquete permitiu que todos ficassem impressionados com a sofreguidão de “Pulga Prenha” ao degustar uma caprichosa coxa de peru, ao estilo das caricaturas que alguns historiadores costumam fazer do rei Dom João VI.

Abarrotado, o prato de “Pulga Prenha” misturava tudo que havia na farta e sortida mesa, deixando cair pelas bordas as tiras de macarrão. Sentado um pouco mais adiante na lateral da mesa, o refinado Bonequinha olhava de soslaio aquele espetáculo pantagruélico, sem que o seu olhar disfarçasse a sua indignada censura.

                                             

#Campanha Vidas Importam

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