O advento da superinteligência artificial e seus impactos

O advento da superinteligência artificial e seus impactos
Fernando Alcoforado*
Desde o desenvolvimento do computador digital na década de 1940, ficou demonstrado que os computadores podem ser programados para realizar tarefas muito complexas – como, por exemplo, comprovar teoremas matemáticos ou jogar xadrez – com grande proficiência. Ainda assim, apesar dos progressos contínuos na velocidade e na capacidade de memória do processamento de computadores, ainda não existem programas que possam combinar a capacidade humana em domínios mais amplos ou em tarefas que exigem muito conhecimento. Por outro lado, alguns programas alcançaram os níveis de desempenho de especialistas na realização de certas tarefas específicas, de modo que a inteligência artificial neste sentido limitado é encontrada em aplicações tão diversas como, por exemplo, diagnóstico médico e reconhecimento de voz.
A inteligência artificial (IA) já está sendo bastante utilizada em sistemas produtivos. Na gestão de sistemas produtivos são utilizados o Business Inteligence e o Big Data. Business Inteligence contempla o uso da coleta de dados, organização, análise, ação e monitoramento que requer softwares robustos para tomar melhores decisões e saber se os investimentos feitos estão trazendo bons resultados. O Big Data   é um modelo de computação focado no processamento e armazenamento de informações em grande volume podendo ser aplicada aos mais diversos ambientes, públicos e privados, que buscam garantir agilidade e eficiência ao processamento de dados. Os algoritmos da Inteligência Artificial rodam no ambiente de Big Data e estabelecem uma comunicação efetiva entre esses dois campos, que são, ao mesmo tempo, diferentes e complementares.
A Inteligência Artificial pode substituir o ser humano nas atividades de produção podendo, também, aumentar ao máximo a sua produtividade. Segundo dados expostos pela Accenture em uma de suas pesquisas, até 2035, a Inteligência Artificial contribuirá para um aumento de até 40% da produtividade do setor industrial, diminuindo custos e aumentando a produção de manufaturas ao redor do globo. Uma rede neural de um sistema de Inteligência Artificial é capaz de analisar mais de um bilhão de dados em poucos segundos, sendo uma ferramenta incrível para apoiar um tomador de decisões dentro de uma empresa, garantindo, assim, a melhor opção dentre as possíveis. Como os dados coletados são constantemente atualizados, os sistemas de Inteligência Artificial sempre atualizam, também, seus resultados, viabilizando que os gestores tenham acesso a informações recentes de variações ocorridas no mercado de atuação da empresa.
Além da utilização em sistemas produtivos, as principais aplicações da inteligência artificial em gestão, no momento atual,  são as seguintes: 1) Chatbots que utilizam a linguagem para conversar com as pessoas de maneira natural e pré-programada, reconhecem nomes e números de telefones e reproduzem o comportamento humano; 2) Aplicações de gestão que são úteis para identificar quais colaboradores estão desempenhando as tarefas com mais eficiência e, com esse tipo de ferramenta, auxiliar a tomada de decisão de gestores; 3) Assistente pessoal que é utilizada para marcar reuniões, horários na agenda e atividades do cotidiano sendo uma das mais conhecidas a Siri presente nos produtos da Apple; 4) Mecanismos de segurança tanto em ataques digitais quanto em situações do cotidiano, como eventos. Na parte digital, o exemplo mais comum é o internet banking; 5) Predições com máquinas equipadas com inteligência artificial que pode ser utilizada em campanhas de marketing, por exemplo, para prever diferentes cenários e possíveis resultados. A partir dos dados captados, o gestor terá mais informação à sua disposição para determinar os caminhos que a empresa deve seguir de acordo com o resultado esperado da estratégia; 6) Vendas e marketing para proporcionar um atendimento de melhor qualidade ao cliente. A personalização do atendimento ao consumidor disponibiliza praticidade e conforto. O machine learning é uma aplicação em que o sistema aprende a agir por sua conta sem ter que ser programado para a nova função; 7) Ensino em que é utilizada a tecnologia de computação como “professor” que fica disponível para os alunos 24 horas por dia.
Em medicina, as principais aplicações da inteligência artificial no momento são as seguintes: 1) Cirurgia Robótica Assistida por IA através da qual robôs podem analisar dados de prontuários pré-operatórios para guiar o instrumento de um cirurgião durante a cirurgia que é considerada “minimamente invasiva” para os pacientes; 2) Auxiliares Virtuais de Enfermagem em que enfermeiros virtuais estarão disponíveis podendo responder perguntas, monitorar pacientes e fornecer respostas rápidas; 3) Auxílio ao Julgamento ou Diagnóstico Clínico em que algoritmos examinam registros médicos, hábitos e informações genéticas de pacientes; 4) Fluxo de Trabalho e Tarefas Administrativas com o uso de tecnologias que podem ajudar a solicitar exames, prescrever medicamentos e escrever anotações em gráficos; e, 5) Análise de Imagens Médicas com o uso de um algoritmo que pode analisar digitalizações em 3D até 1.000 vezes mais rápido do que é possível hoje.
Em engenharia, as principais aplicações são as seguintes: 1) Tarefas rotineiras com o uso de robô capaz de reproduzir diversas tarefas humanas em um canteiro de obras como na manipulação de materiais de construção e montagem das estruturas sistematicamente com uma precisão milimétrica com uma taxa de erro próxima de zero; 2) Big Data que é uma tecnologia que pode ser aplicada para analisar a situação da obra nos mais diversos canteiros de obras; 3) Impressão 3D para montar estruturas pré-moldadas e pré-fabricadas; 4) Prédios inteligentes com Inteligência Artificial que, além do projeto de estrutura física faz o planejamento de uma infraestrutura inteligente, capaz de facilitar a vida dos usuários.; 5) Gestão mais eficiente com o uso do Robot Process Automation (RPA), que é um robô criado para manipular sistemas digitais, realizar o cruzamento de dados e eliminar os erros que aconteceriam caso uma pessoa assumisse essa tarefa; e, 6) Atendimento ao cliente para programar robôs de atendimento de clientes.
O aprendizado de máquina (machine learning) é um campo de ciência da computação que dá aos computadores a capacidade de aprender sem serem explicitamente programados. Arthur Samuel, um pioneiro norte-americano no campo de jogos de computador e inteligência artificial, cunhou o termo “Aprendizado de máquinas” em 1959, quando trabalhava na IBM. O aprendizado de máquina está intimamente relacionado com as estatísticas computacionais (e muitas vezes se sobrepõem), que também se concentra na criação de previsão através do uso de computadores. Tem fortes laços com a otimização matemática, que fornece métodos, teoria e domínios de aplicação ao campo. Na análise de dados, o aprendizado de máquina é um método usado para conceber modelos e algoritmos complexos que se prestam à predição. Em uso comercial, isso é conhecido como análise preditiva. Esses modelos analíticos permitem que pesquisadores, cientistas de dados, engenheiros e analistas “produzam decisões e resultados confiáveis e repetíveis” e descobrem “insights ocultos” através da aprendizagem de relacionamentos históricos e tendências nos dados.
Em 1950, o cientista da computação britânico Alan Turing já especulava sobre o surgimento de máquinas pensantes (thinking machines) em sua obra “Computing Machinery and Intelligence”, e o termo “inteligência artificial” (IA) foi cunhado, em 1956, pelo cientista John McCarthy. Na década de 1990, a comunidade dedicada à inteligência artificial deixou de lado uma abordagem baseada na lógica, que envolvia criar regras para orientar um computador como agir, para uma abordagem estatística, usando bases de dados e pedindo para a máquina analisá-los e resolver problemas por conta própria. Especialistas acreditam que a inteligência das máquinas se equiparará à de humanos até 2050, graças a uma nova era na sua capacidade de aprendizado. Computadores já estão começando a assimilar informações a partir de dados coletados. Isso significa que estamos criando máquinas que podem ensinar a si mesmas e também a se comunicar simulando a fala humana, como acontece com os smartphones e seus sistemas de assistentes virtuais.
Graças aos avanços na inteligência artificial, o mundo dos negócios se encontra diante de gigantescas transformações. É uma nova era na qual as regras fundamentais que regulavam as atividades das organizações estão sendo reescritas. Sistemas de inteligência artificial não significam apenas a automação de muitos processos para fazê-los mais eficientes. Estes sistemas de Inteligência Artificial estão fazendo o mundo passar por uma transição fundamental com as máquinas se desenvolvendo além do seu histórico papel como ferramenta ao se transformarem em “trabalhadores autônomos”.  Em consequência, os sistemas de Inteligência Artificial estão mudando, portanto, a verdadeira natureza do trabalho que está a exigir que a gestão das operações com máquinas  e trabalhadores seja processada de forma bastante diferente em relação ao passado.
Nos últimos anos, assistimos a progressos surpreendentes em áreas como aprendizagem independente, previsão, navegação autônoma, visão computacional e gameplay de vídeo. Os computadores agora podem negociar ações na ordem de milissegundos, carros automatizados estão aparecendo cada vez mais em nossas ruas e assistentes artificialmente inteligentes invadiram nossas casas. Os próximos anos vão nos apresentar ainda mais avanços, com a Superinteligência Artificial através de máquinas que podem aprender com suas próprias experiências, adaptar-se a situações novas e compreender abstrações e analogias. A inteligência de máquina de nível humano tem boas chances de ser desenvolvida até a metade do século XXI da qual pode resultar a Superinteligência Artificial. A Superinteligência Artificial será a primeira tecnologia a superar potencialmente os humanos em todas as dimensões. Até agora, os seres humanos tiveram o monopólio da tomada de decisões e, portanto, tinham controle sobre tudo. Com a Superinteligência Artificial, isso pode acabar. Uma ampla gama de consequências poderá ocorrer, incluindo consequências extremamente boas e consequências tão ruins quanto a extinção da espécie humana.
Mesmo que a Superinteligência Artificial produza benefícios para a humanidade, há o risco de que ela seja utilizada para o mal e não para o bem da humanidade. A imediata consequência do progresso da inteligência artificial é o avanço do desemprego. Este efeito social negativo já está acontecendo e é inevitável porque resulta de forças econômicas que estão fora de controle. A inteligência artificial é positiva para o capitalista que fará uso dela para enfrentar seus concorrentes de forma mais competitiva haja vista que proporcionaria, entre outras vantagens, o aumento de sua produtividade e a redução de seus custos. No entanto, seria, também, extremamente negativa para o sistema capitalista porque tende a reduzir a renda à disposição da massa dos trabalhadores excluídos da produção contribuindo, desta forma, para a queda na demanda de produtos e serviços e, consequentemente, dos lucros auferidos. Seu impacto sobre a sociedade seria devastador com o desemprego em massa resultante de sua utilização em larga escala. O risco de que a Superinteligência Artificial seja utilizada em prejuízo da humanidade é muito grande porque pode ser utilizada para o mal em ato de desespero pelos detentores do capital para reprimir os movimentos sociais como arma para manter a todo o custo o moribundo sistema capitalista que deve chegar ao fim em meados do século XXI.
Há, também, o risco de que a Superinteligência Artificial ser utilizada pelas grandes potências para desenvolver armamentos mais poderosos do que os atuais para defender seus interesses e impor sua vontade na cena mundial. Se as grandes potências embarcarem em uma corrida armamentista com o uso de Superinteligência Artificial contra nações rivais, uma Superinteligência Artificial armada poderia sair do controle, seja em tempo de paz ou durante uma guerra. Uma Superinteligência Artificial poderia intencionalmente acabar com a humanidade destruindo a atmosfera ou a biosfera do nosso planeta com nanotecnologia auto-replicadora ou poderia disparar todas as nossas armas nucleares, desencadear um apocalipse robô como no Exterminador do futuro ou liberar alguns poderes da física que sequer conhecemos.
Existem cenários extremamente negativos como o das próprias máquinas superinteligentes decidirem destruir os seres humanos, por exemplo, acabando com nossa civilização e infraestrutura. A Superinteligência Artificial pode representar, também, a extinção da raça humana, segundo o cientista Stephen Hawking que publicou artigo abordando esta questão em 1º de maio de 2014 no jornal The Independent. Hawking afirmou que as tecnologias se desenvolvem em um ritmo tão vertiginoso que elas se tornarão incontroláveis ao ponto de colocar a humanidade em perigo. Hawking conclui: hoje, haveria tempo de parar; amanhã seria tarde demais.
A Superinteligência Artificial poderá, entretanto, contribuir decisivamente pata o avanço científico e tecnológico visando dotar a humanidade dos recursos necessários para enfrentar as ameaças vindas do espaço sideral e buscar soluções para os seres humanos desenvolverem tecnologias capazes de levá-los para novos habitats no sistema solar e fora dele em busca de sua sobrevivência com o afastamento da Lua em relação à Terra, com a colisão entre as galáxias Andrômeda e Via Láctea, a morte do Sol e o fim do Universo em que vivemos. Com máquinas mais inteligentes do que nós, com a Superinteligência Artificial, a humanidade poderá se utilizar delas para solucionar problemas científicos e tecnológicos que assegurem a sobrevivência da espécie humana até mesmo com o fim do Universo em que vivemos ao abrir caminho para universos paralelos. Se algum dia os cérebros artificiais superarem a inteligência dos cérebros humanos, então esta nova superinteligência pode se tornar muito poderosa. O destino da humanidade se tornaria, portanto, dependente das ações destas máquinas superinteligentes.
Até agora, os seres humanos tiveram o monopólio da tomada de decisões e, portanto, tinham controle sobre tudo. Com a Superinteligência Artificial, isso pode acabar. A Superinteligência Artificial tem o potencial de transformar profundamente a sociedade humana de forma positiva, mas também de forma negativa se ela sair do controle e se voltar contra a humanidade. O impacto de curto prazo da Superinteligência Artificial depende de quem a controla, mas o impacto a longo prazo depende de saber se ela pode mesmo ser controlada. Nick Bostrom afirma em seu livro Superinteligência que a Superinteligência Artificial representa um risco que ameaça a extinção prematura de vida inteligente na Terra, ou a destruição permanente e drástica de seu potencial para um desenvolvimento futuro desejável (BOSTROM, Nick. Superinteligência. Rio: DarkSide Books, 2018).
Bostrom explicou que a Superinteligência Artificial requer que sejam desenvolvidos  melhores mecanismos de controle. Bostrom afirma que precisaremos ter esses mecanismos de controle antes de criar os sistemas inteligentes atraindo os maiores especialistas em matemática e ciência da computação para esse campo. Ele sugere que haja uma forte colaboração de pesquisa entre a comunidade de segurança e a de desenvolvimento da Superinteligência Artificial, e para que todas as partes envolvidas incorporem o Princípio do Bem Comum em todos os projetos de Inteligência Artificial  de longo prazo. Esta é uma tecnologia única, disse Bostrom, que deve ser desenvolvida para o bem comum da humanidade.
* Fernando Alcoforado, 80, condecorado com a Medalha do Mérito da Engenharia do Sistema CONFEA/CREA, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona,http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011), Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012), Energia no Mundo e no Brasil- Energia e Mudança Climática Catastrófica no Século XXI (Editora CRV, Curitiba, 2015), As Grandes Revoluções Científicas, Econômicas e Sociais que Mudaram o Mundo (Editora CRV, Curitiba, 2016), A Invenção de um novo Brasil (Editora CRV, Curitiba, 2017),  Esquerda x Direita e a sua convergência (Associação Baiana de Imprensa, Salvador, 2018, em co-autoria) e Como inventar o futuro para mudar o mundo (Editora CRV, Curitiba, 2019).
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