Gestão em saúde: por que precisamos mudar?

Gestão em saúde: por que precisamos mudar?

Este é o primeiro artigo e faz parte de uma série denominada: Debates sobre Mudanças na Gestão em Saúde e objetiva apresentar uma breve reflexão sobre a crise atual dos Sistemas de Saúde e discutir porque precisamos mudar.

Apresentamos problemas de saúde do século XXI e Sistemas de Saúde da metade do século XX. Isso é caracterizado por Mendes (2012) como a “Ruptura do Postulado da Coerência”, o que provoca crises, pois vivenciamos mudanças muito rápidas e uma capacidade muito lenta dos Sistemas de Saúde pra se adaptarem às mudanças. No contexto atual, com referência à Gestão de Serviços de Saúde e para que se compreenda porque precisamos mudar, é preciso que se observem as transições: nutricional, tecnológica, demográfica e epidemiológica.
No que se refere à transição nutricional, um exemplo citado por Mendes (2012) é que 1 a cada 3 crianças de 5 a 9 anos apresenta sobrepeso ou obesidade. No que se refere à transição tecnológica, sabe-se que as tecnologias médicas, quando bem aplicadas, melhoram a vida das pessoas. As mudanças tecnológicas têm influenciado as praticas nos serviços de saúde e criado o paradoxo do crescimento exponencial das tecnologias médicas e o aumento da complexidade clinica, o que resulta em mais informações e mais decisões, tanto para os profissionais, quanto para os pacientes e familiares.

Além disso, há a inconsistência estrutural entre o tempo clínico disponível para uma consulta/procedimento e o incremento da complexidade. Na prática isso significa que os profissionais necessitam fazer mais em menor tempo e resulta que só metade dos usuários recebem informações claras sobre os benefícios do tratamento. Dos que recebem as informações claramente, 50% não as compreendem e os demais 50%, compreendem-nas equivocadamente, além do que, segundo o Mendes (2014), estudos realizados em ambulatórios nos EUA revelaram que, numa consulta, os médicos interrompem o paciente 18 segundos depois que este começa a falar.
Estudos de Brownlee (2008) apud Mendes (2012) revelam que nos EUA gastam desnecessariamente em saúde 30 a 50% dos seus gastos totais do setor e que procedimentos injustificados são responsáveis por 30 mil mortes/ano. Surge assim, naquele país, a proteção quaternária para proteger dos tratamentos e diagnósticos desnecessários, elevando ainda mais os custos.

No que se refere à transição demográfica, projeções da OMS para 2025 incluem o Brasil entre os dez países do mundo com maior contingente de pessoas com 60 anos e mais. A proporção de idosos no Brasil passou de 6,3% em 1980 para 7,6% em 1996, estimando-se 14% em 2025.Sabe-se que não é a transição demográfica que abala os custos, mas sim a não estabilização das condições crônicas e nesse quesito fracassamos, pois os Sistema de Saúde brasileiro (SUS e também o Privado) estão voltados para o atendimento de pacientes agudos. Aprofundaremos este tema no segundo artigo.

No que diz respeito à transição epidemiológica o Brasil apresenta uma tripla carga de doença, na qual as doenças crônico-degenerativas responderam por 66,3% da carga de doença; as doenças infecciosas responderam por 23,5% e as causas externas foram responsáveis por 10,2%. A justaposição das doenças infecciosas e parasitárias com as crônico-degenerativas reforçam a importância de se considerar a morbidade como um aspecto relevante na gestão e no financiamento dos Sistemas Saúde.

O indicador DALY (Disability Adjusted Life of Years ou Anos de Vida Perdidos Ajustados por Incapacidade) reúne dois componentes: morbidade e mortalidade, medindo simultaneamente o impacto da mortalidade e dos problemas de saúde que afetam a qualidade de vida das pessoas O indicador, ao incluir a perda de vida em função da incapacidade traz ao debate as conseqüências não fatais da doença, pouco medidas e utilizadas como indicadores de necessidades de saúde (MURRAY & LOPEZ, 1996 apud SCHRAMM et al., 2004) e facilita as decisões sobre a alocação de recursos, subsidiando a tomada de decisão dos gestores dos Sistemas de Saúde.

O cenário projetado para 2020 por Murray & Lopez (1996) apud Schramm (2004) para o indicador DALY evidencia que entre as cinco principais causas de anos de vida perdidos por morte precoce e incapacidade estão: as doenças isquêmicas do coração, depressão, acidentes de trânsito, doenças cerebrovasculares e doenças pulmonares obstrutivas crônicas. Isso indica a importância das doenças crônico- degenerativas como problema de Saúde Pública e demanda a reestruturação do sistema de atenção básica e hospitalar para promover a prevenção, diagnóstico, tratamento precoce das incapacidades geradas por estes agravos (RAMOS et al., 1993 apud SCHRAMM, 2004).

As análises das transições nutricional, tecnológica, demográfica e epidemiológica são fortes aliados da Gestão dos Sistemas de Saúde. Neste sentido, os custos crescentes para os sistemas de saúde em relação ao impacto das complicações relacionadas aos agravos não-transmissíveis merecem destaque. Cerca de 40% a 60% das amputações não traumáticas em membros inferiores são realizadas em pacientes com diabetes (Grupo de Trabalho Internacional sobre Pé Diabético, 2001, apud SCHRAMM et al.,, 2004). Outra complicação freqüente associada a diabetes tem sido a Insuficiência Renal Crônica, IRC (BRUNO & GROSS, 2000; KLAG et al., 1996 apud SCHRAMM et al.,, 2004) ). Isto significa uma baixa qualidade de vida para as pessoas e um importante problema econômico para o País, que pode ser evitável. A discussão sobre como mudar é o objetivo do segundo artigo da série Gestão em Saúde: por que é preciso mudar e que se denomina “Gestão em Saúde: o que mudar”.

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